"Tenha em mente que tudo que você aprende na escola é trabalho de muitas gerações. Receba essa herança, honre-a, acrescente a ela e, um dia, fielmente, deposite-a nas mãos de seus filhos." (Albert Einstein)

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sábado, 29 de agosto de 2009

ANÁLISEDAOBRA: Boca de Chafariz


BOCA DE CHAFARIZ, de Rui Mourão
Boca de Chafariz, de Rui Mourão, foi publicado em 1991, onde o autor conta uma história fantasticamente mineira: imagina Ouro Preto sendo destruída por um avassalador temporal e onde figuras que se relacionam com sua história voltam para salvá-la. Misturam-se surrealisticamente Aleijadinho e Rodrigo Mello Franco, Tiradentes e Aloísio Magalhães, os inconfidentes, Guignard, Tarquínio de Oliveira, Edson Mota, Jair Inácio e muitas outras personagens vivas e mortas numa miscelânia da história.

Portanto, é uma narrativa histórica que constrói-se na confluência entre o ficcional e o histórico. Boca de chafariz revela-nos saborosas outridades: as personagens históricas de Ouro Preto da Inconfidência atuam noutra situação histórica, de 1979, ano em que a cidade foi castigada por uma enchente. Nessa versão, as personagens de Mourão assumem a “persona" de seus personagens históricos para, conhecendo-os interiormente, figurar-lhes a essencial humanidade.

A tensão entre o passado e o presente, um dos eixos geradores da obra, é apresentada desde o início do livro.
Baseando-se em um fato real, como já visto, fartamente noticiado pela mídia, o autor se aproveita para construir a sua versão da história ouropretana, a partir de uma perspectiva múltipla que faz aflorar tanto a necessidade de preservação da cidade-monumento, quanto a sintonia com a vida do cidadão comum que a habita. O livro utiliza-se das notícias de jornais para alicerçar sua narrativa, em que a catástrofe pluvial que se constituiu em ameaça de morte para Ouro Preto estende sua ameaça a vários outros aspectos, relativos à ordem cultural e social da cidade. Os estragos causados pelas chuvas e noticiados pelos jornais da época, ao participarem do relato romanesco como base de sua construção, tornam-se bastante próximos aos monumentos e marcas históricas que fizeram de Ouro Preto Patrimônio Cultural da Humanidade, na medida em que destacam a possibilidade de sua ruína. No caso, um patrimônio em risco e que necessita de defensores, necessidade que os narradores em primeira e terceira pessoa que se pronunciam em Boca de chafariz tentam suprir. Esses narradores, ao superarem as fronteiras que separam fictício, imaginário e realidade, permitem que se caracterize o referencial a que se remetem, sem se deixarem determinar por ele.

A estrutura do romance parece bem de acordo com a aventada transgressão, quando se divide em capítulos enunciados alternadamente por narradores em primeira pessoa e pelo narrador em terceira pessoa que canaliza a voz de seu autor implícito. Falam no romance, em primeira pessoa, narrando a sua versão da história construída a partir de Ouro Preto, personagens da história mineira como Aleijadinho, considerado o maior artista colonial brasileiro com suas esculturas e trabalhos arquitetônicos mundialmente reconhecidos; Tiradentes, partícipe da Inconfidência Mineira, elevado a herói nacional e figura emblemática do processo de independência do Brasil face a Portugal; Antônio Dias, bandeirante paulista que iniciou a ocupação/construção da cidade; Luís da Cunha Menezes, capitão-general e governador da Capitania de Minas Gerais, conhecido por seus desmandos administrativos e figura central de uma obra satírica, Cartas Chilenas, da autoria de Tomás Antônio Gonzaga, poeta e participante da Inconfidência Mineira e outros. (Os nomes em vermelho acima, são os personagens do livro que narram a sua versão, em primeira pessoa, da história).

A essas vozes (dos personagens citados acima) junta-se a de um narrador em terceira pessoa que ora se refere aos governantes da década de 1970 – o Ministro da Educação e Cultura; o presidente da Embratur; os dirigentes do Patrimônio Histórico Nacional e do Departamento Nacional de Estradas e Rodagens; ora à população atual da cidade - Bené da Flauta, artesão, poeta e músico; Jair Afonso Inácio, restaurador; um estudante da Escola de Minas e de Metalurgia, Napoleão Gustavo de Souto, o Cupica; ora a figuras que atuaram em diversos níveis na cidade, como Claude-Henri Gorceix, francês que em finais do século XIX foi convidado a instalar a Escola de Minas e de Metalurgia; Tarquínio J. B. de Oliveira, historiador paulista que se dedica à história de Ouro Preto.

Por meio dessa estratégia textual, Boca de chafariz conduz o leitor a reconsiderar, na estreita encruzilhada em que se encontram história e ficção, a inserção do mito na realidade vivenciada por habitantes de espaços que se destinam a preservar a memória do país. (...)

O elemento água, desde o título (chafariz: obra de alvenaria, com uma ou mais bicas, por onde corre água, para utilidade pública), perpassa o motivo principal do enredo e desenlace da narrativa. (...)

A estrutura do livro imita a estrutura da cidade em seu movimento de construção. A composição de seus capítulos remete o leitor às injunções políticas que contribuíram para as modificações sofridas pelo berço de ouro que despertou a cobiça da metrópole e também possibilitou ao Brasil adquirir forças para constituir-se em nação.

Aleijadinho, artista maior do estilo barroco (perceber que o livro se enquadra no estilo Barroco) que a Colônia instalou nos trópicos, aparece no romance a partir de sua primeira obra, o chafariz que dá origem ao título do livro e que será objeto da pesquisa feita pelo historiador e também personagem Tarquínio J. B. de Oliveira. Pela análise arqueológica da peça, o historiador entrevê a possibilidade de haver envolvimento entre a Inconfidência Mineira e o movimento maçônico, o que traria nova interpretação ao episódio e seria a mais importante descoberta da área. (...) Nesse sentido, a personagem Aleijadinho pode ser tomada também como representativa da tensão do corpo-cidade ameaçado de desfiguração e desaparecimento, tensão que o romance focaliza e que faz levantar as várias vozes que nele se pronunciam em sua defesa. Aleijadinho, quando já acometido pela doença (lepra) que o maltratava, reconhece a enorme dificuldade de sobreviver como mestiço numa sociedade escravocrata e colonial. O aspecto pode ser inferido pelas figuras de feição grosseira e atormentada das imagens por ele esculpidas para igrejas, capelas e adros de cidades mineiras (figuras de feição grosseira é uma das características da pintura e escultura barrocas, já que expressam os conflitos que o ser humano enfrentava na época) . Mas será delineado explicitamente em trechos narrativos que longamente discorrem sobre os sofrimentos do artista, como os que aparecem na citação que se segue, retirada de um dos três capítulos que o romance lhe destina: "Eu pude sofrer no meu canto, como talvez ninguém sofreu no mundo, o drama de não ter sido apenas um homem – de ter sido acima de tudo uma contradição autodestrutiva. (...) É possível a um mulato sair do seu canto sem problemas, num ambiente dominado pela escravidão? Preciso reconhecer em definitivo esse fato e não continuar insistindo na tentativa até ridícula de querer convencer a mim mesmo de que houve um tempo em que não tive consciência da minha origem de senzala. (...) Renunciei à antiga entusiasmada disposição para a conquista dos espaços à minha frente, compreendi afinal que a realidade tinha múltiplos compartimentos e a nossa limitação para percorrê-los já vinha estabelecida a partir do berço. (...) Via com desgosto que, na minha juventude, fora do círculo de meu pai, só tive bom acolhimento no meio artístico por parte de mulatos, como os músicos. Na irmandade dos pardos é que de fato existia ambiente para mim."(p. 195-196-197-198)

A Aleijadinho o romance alia a figura de Bené da Flauta. Artesão contemporâneo, Bené vende seus trabalhos a turistas na Praça Tiradentes, ao mesmo tempo em que executa músicas de sua autoria para atrair fregueses. O narrador a ele se refere como: "Poeta permanente, músico e compositor nos momentos de folga, principalmente escultor popular e mais principalmente ainda bêbado vinte e quatro horas por dia, Benedito Pereira da Silva, Bené da Flauta, ou apenas Bené, viu o mundo no município de Barra Longa. Mas a sua história era toda ouro-pretana." (p. 101)

Necessário é ressaltar que os capítulos sobre Bené sucedem-se aos de Aleijadinho. Figura com que se fecha o romance, Bené arma, também em pedra sabão, como seu genial antecessor, a seguinte frase: OURO PRETO PATRIMÔNIO CULTURAL DA HUMANIDADE. Por sua simplicidade, a peça contrapõe-se à famosa obra de Aleijadinho. Como se pode notar, tal estratégia narrativa põe em jogo a questão do julgamento de valor, tanto no campo artístico, quanto no social e humano. Ao focalizar preferencialmente o lado humano, carente e problemático de Antônio Francisco Lisboa, que no livro suplanta a figura do célebre Aleijadinho, e dedicar-lhe a mesma simpatia com que se refere a Bené, o romance permite abonar o encaminhamento da reflexão que venho desenvolvendo. Aproximando as duas figuras, o livro suscita indagações variadas: o valor do artesanato em confronto com a arte maior; a sobrevivência/convivência do cotidiano de uma cidadezinha do interior mineiro face a sua eleição como Patrimônio Cultural da Humanidade; o lugar social do elemento mestiço diante da hegemonia do europeu, entre outras. (...)

Em Boca de chafariz interagem e atualizam-se a arquitetura da cidade e o elemento humano, recriador e herdeiro daquela e que lhe confere diferentes significados em cada um de seus momentos.
Fonte parcial: Maria do Carmo Lanna Figueiredo, Daniel Gouvêa (PUC-Minas)


7 comentários:

  1. Este comentário foi removido pelo autor.

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  2. Vou espalhar pra todos os 1º lá da escola
    [/Bem q a escola podia liberar a sala de info p genti entrar no seu Blog né...!!!

    By: Caique

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  3. Caique, pode espalhar... É sempre bom ter visitantes aqui. Volte sempre e faça bom proveito de tudo que posto aqui. É pra vcs mesmo... E qto a sua idéia... Vou pensar.

    Um abraço.

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  4. gostei muito dessa analise do livro boca de chafariz.....entendi direitinho..vai me ajudar muito na minha prova de literatura!!!!!!!!!
    muito obrigada.......
    abraçosssssssssssss
    obs:so jesus salva.Pense nisso

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  5. gostei muito do livro achei muito interessante
    algo diferente romance intelectual,pensador

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  6. Prof. Brigadão ajudo muito!!!
    detalhe nem precisei ler o livro!!!
    kkkkkkkkkk

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